terça-feira, 1 de dezembro de 2009

QUINZE

Muita gente anda perguntando, onde estou. Onde me meti nesse mês de novembro último. As poucas vozes que escuto (afinal não ando circulando) me dizem: "Sylvia cadê você?" Pra culminar, recebi um e-mail: "você morreu?" Quase. A culpa é da faculdade que resolví fazer depois de velha e de outro pequeno detelhe chamado sobrevivência. Entre provas e trabalhos eu ainda fui fazer um trabalho de verdade. Ficou impossível circular por aí
Tudo seria mais fácil é claro, se eu fosse uma pessoa simples. Uma pessoa normal, sai sexta depois da aula, volta pra casa. Dorme, acorda no sábado e estuda. Genial. Eu não. Uma simples saída pra mim é uma odisséia. Pra início de conversa, só me dou com gente intensa e tudo sempre acaba numa festa. Ir alí pra mim é sempre o Anjo Exterminador, aquele filme do Buñel em que a porta está escancarada e ninguém consegue voltar pra casa. Querem ver? Outro dia fui "alí" no Leblon, mais exatamente no Jobi. Nossa Jobi é sempre um problema. Toda história longa em algum momento tem o Jobi como locação. Pois então, fui alí no Jobi com dois amigos rapidinho. O telefone toca. Parênteses, é por isso que desde que perdí meu celular não adquiri outro. Meu celular só tocava quando eu estava na rua, impressionante. Mas o telefone do amigo tocou. Era o pessoal chamando pra outro bar em Botafogo. Ok. Chego no bar e encontro umas 14 pessoas amigas. Fenômeno que me choca. Eu não saio na rua e encontro conhecido, colega. Eu saio na rua e encontro amigo.
A) O Rio de Janeiro é uma aldeia.
B) Eu vivo encimesmada no meu mundinho.
C) Tá na hora de mudar de point?
Todas as alternativas estão corretas. Enfim estou lá com 16 pessoas da minha mais alta intimidade, que não marcaram de se encontrar. Pra piorar é alta a porcentagem de quem já me comeu em algum momento da minha vida. De repente chega mais um e avisa de uma festa. Tudo acaba em festa, eu já disse isso hoje. No fim da festa às quatro da manhã, surge a idéia do koni e volto pro Leblon. No meio do koni a amiga chama o povo pra casa dela e quando eu vejo são 10 horas de sábado e a festa nunca termina. E me lembro que não comecei a noite no Jobi, ainda na noite de sexta fui a um vernisagem.

Agora eu pergunto: dá pra confiar? Se eu tenho que estudar, não é mais sábio (afinal com a turma que eu tenho) ficar em casa calma e deixar o leão adormecido?
Essa ida "alí" foi depois das mil provas e trabalhos é claro. Antes a correria foi tanta que até o remendo do meu dente, que eu coloquei outro dia, resolveu soltar. Fui fazer a prova com o dente colado com super bonder, veja você que falta de glamour. Coloquei a culpa numa batida de dente que andei dando por aí. Mais é mentira, a dentista disse que meus sisos estão pressionando a arcada e descolando o remendo. Parece que é pra eu, além de evitar as maçãs, não esquecer mais de levar o super bonder na bolsa. Pelo menos até tomar coragem e tirar os sisos.
Entre muitos trabalhos, fiz uma prova de semiótica e um cenário. Aqui eu vou explicar. Eu não sou artista. Sylvia não é artista, artista é o caralho. Ok. Eu faço figurino, meu negócio é moda, é roupa. Não me fale em arte. Por um detalhe que não é da minha alçada, pra aprender figurino, tenho que frequentar uma escola de artes, que preguiça. E pior, ainda tenho que conviver com uma gentalha que faz teatro. Credo. Uma gente sem berço, que se cumprimenta fazendo escândalo, um pessoal muito íntimo sabe? Hummm. Pra mim esse negócio de ator é tudo "pobrema" de ego. Gente que quer aparecer.
Pára com isso, o elegante é ser discreto. Tenho muita aula com esse tipo de gente, tive até que fazer uma apresentação, que absurdo. A cena era num banheiro e meu cenário era uma privada. Estava pragmaticamente tentando resolver, quando meu parceiro de cena (só podia ser ator) me manda a seguinte sentença: " não precisa de privada, você não vai na aula de semiologia?" Adonai. Nesse momento tive uma epifânia, uma revelação divina para os desatualizados. Entendi a semiótica da semiótica. A aula de semiologia é lavagem cerebral! A faculdade federal na verdade tá querendo dizer o seguinte: "você artista, se conforme com a falta de verba. Não vai rolar Miss Saigon. Peça com helicóptero de verdade em cena, hélice girando no palco, esquece. Não vai dar. Mas com ajuda do camarada Pierce e do camarada Saussure (nada me tira da cabeça que esses dois são comunistas) e da sua semiótica nós estamos aqui pra te convencer, ops ensinar um negócio muito mais legal, que o tal helicóptero em cena. O signo. Faz o seguinte querido artista: pega aí um cubo preto de madeira, junta um monte e diz que é um signo do helicóptero." Olha que maravilha, não precisa apoiar a arte, o cubo resolve, e a garrafa pet também é joia. Ótimo. A semiologia é pra gente se conformar e aprender a fazer peça cubo. Semiótica igual a, esquece Miss Saigon.
Maravilha já resolvi a tese de mestrado, "o cubo, o signo e as mil utilidades" um problema a menos na minha vida, agora é só desenvolver isso. Tenho certeza que um dia eu vou abrir uma porta na faculdade e dar de cara com mais de 10 mil cubos de madeira pretos. Saca a sala precisa de Hogwarts? Aquela do Harry Potter, nego só acha a porta quando tá precisando de alguma coisa. A pessoa mentaliza "preciso de um banheiro", aparece uma porta e é um banheiro. Então, um dia eu vou mentalizar (porque lavagem cerebral é um troço que funciona), abrir a porta e encontrar todos os cubos do mundo. Vou montar todo o repertório da Broadway com cubo de madeira. Vai ficar uma beleza, de Wicked ao Hamlet do Jude Law. Esse vai ser o melhor, porque vou estar dominando a semiótica a tal ponto, que vou mandar pintar dois olhos azuis, verdes, whatever, num cubo e transformar o cubo num índice, num rastro do Jude Law. Genial.